Estava assistindo um seriado que tem como foco principal a vida de uma escritora de uma revista feminina dos Estados Unidos, e, lá para as tantas da quarta temporada da série, ouvi uma frase que me impactou de uma forma tão singela que não estava esperando… Uma frase que, apesar de parecer óbvia, me fez olhar a minha carreira com outros olhos.
“Ele é um escritor. Escritores escrevem! É isso que fazem, simples assim” – disse a personagem, quando alguém a questionou sobre um artigo polêmico que saiu numa revista. Escritores escrevem, disse ela. Simples assim. Como 2+2 são 4? Assim como cozinheiros cozinham, pintores pintam, engenheiros constroem… mas, será mesmo?
Nesse momento, pausei o episódio e parei no tempo para pensar. Como escritora que sou, na mesma hora, peguei também um papel e uma caneta – que, sem surpresa nenhuma, encontram-se sempre por perto, ao alcance de um pensamento inusitado…
Escritores escrevem! Isso é, de fato, uma verdade. É o que fazem! É assim que ganham dinheiro, fazem carreira e sustentam suas vidas… Mas, para além do fazer profissional, eu sempre achei que o “escrever” fosse muito mais do que um ofício.
Quando o objeto de trabalho de alguém é algo tão subjetivo, interpretativo, complexo, tão intensamente emocional, vivo, que se transforma, se transmuta, se expande e transborda, algo que vai tão além das linhas e preenche até as entrelinhas do pensar… Algo assim como a escrita, logo o simples parece virar algo totalmente mirabolante e, em certos casos, até meio mágico, místico, poderoso, sabe?!
Muito já escrevi sobre como a escrita é processual, é sobre praticar, ter cronograma, planejar, se responsabilizar, treinar, aprimorar e cumprir obrigações – tal qual qualquer outro trabalho… Mas, ao mesmo tempo que ela é SIM tudo isso. Escrita é também criativa, livre, ferramenta de transformação intima, ferramenta de mudança de paradigmas do mundo! Escrever é libertador, é terapêutico e catártico!!!
Eu já escrevi muito em momentos de dor… Aliás, é quando mais a escrita se faz necessária para mim, quando funciona como calmante, com nocaute mais forte até que qualquer ansiolítico ou antipsicótico aplicado na veia.
Escrevo quando quero desabafar e quando preciso me entender e tudo que tentei antes já falhou… Até porque, não tem como mentir para si mesmo no papel! Não dá… Eu, pelo menos, nunca consegui. Sempre que vou escrever para mim, a mentira não saí… Sempre que tento, ela borra a tinta, vai com erro brutal de português, como se o papel conseguisse me ver mais que eu mesma em frente ao espelho e me gritasse:
— Ei! Não, aqui não! Você sabe que isso não é verdade. Vai mentir para si mesma? Mentir para mim???
Toda escrita, para mim, é terapêutica. Assim como, para mim, toda escrita é também trabalho. É pessoal, é íntimo, é secreto. E deve ser mostrado!!! Deve ser lido, escancarado, postado, publicado. Porque escrita é mágica, sim! Ela muda a mim, muda a quem lê/ouve e muda o mundo… um texto por vez. E eu acredito nesse poder muito mais que acredito em qualquer outro poder, vibração ou ser místico.
A escrita é aquela que anda na tênue linha do difícil equilíbrio entre carreira e vida pessoal, daquele que se guarda, mas, ao mesmo tempo, se expõe demais. Porque é totalmente possível você doar sua alma a um texto, e mesmo assim não dizer uma palavra daquilo que realmente acontece! É a cortina de fumaça que consegue fazer o outro, quem quer que seja, sentir exatamente o que você sente, enquanto não revela absolutamente nada de si.
Eu sou escritora e, por muitas vezes, eu escrevi. Escrevi sobre “outrens” que não gostaram de se ver na minha escrita. Já escrevi também sobre um alguém que nunca se enxergou, mesmo absolutamente e obviamente exposto em cada palavra, de cada linha. Já também escrevi sobre mim e fiz com que outras pessoas olhassem para o reflexo num lago límpido… Mesmo que não tenha sido essa minha intenção.
O jeito que a escrita toca as pessoas faz parte de um universo particular que só cabe a ela (a escrita), a quem lê e, de fato, a quem escreve… Um de cada vez, cada um no seu lugar e todo mundo junto – tudo ao mesmo tempo… entende???!
E, por mais complicado, por mais estranho e caótico que tudo isso possa parecer… No final das contas, escritores escrevem. E isso é o que é, simples assim. Eu, como escritora que sou, senti necessidade, hoje, de escrever. Escrever sobre meu processo, sobre o turbilhão mental que às vezes sinto em passar em minha mente sem aviso meteorológico para me preparar, escrever sobre o quanto gosto de escrever. Escrever, somente, porque sou escritora e, no final das contas, preciso escrever.
Gabriella Maciel – Consultora de Escrita
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2 Comments
Aii que texto maravilhoso, tu escreve bem demais!! Sou fã 😍
Quando amamos nossa profissão descobrimos sua magia, assim como você faz ao escrever tão lindamente! ❤️